“Não sou só eu. Não somo evoluídos. Estamos no princípio. O Dr. Salvado, meu dentista, explicou-me no outro dia que os seres humanos mais evoluídos já não têm sisos nem incisivos. O Dr. Castro Caldas, meu neurologista, a quem devo o sono e o bom senso que me resta, revelou-me que ainda estamos na pré-historia e que todos os medicamentos são grosseiros.
Estamos mal. A procissão ainda vai no adro. A Idade da Pedra não só começou mal, como mal começou. Estamos a matar-nos todos uns aos outros. Não percebemos nada. Andamos de um lado e de um dia para o outro sem saber porquê.
Somos ainda selvagens. Somo macacos. Rio-me de quem acrescenta nus ou inteligentes. Somos praticamente tão peludos e estúpidos como os chimpanzés. O que nos distingue, tal como os chimpanzés, é a mania de que somos bons.
Estamos atrasados. O nosso atraso não é tecnológico. É civilizacional. Não sabemos comer a mesa. Não sabemos vestir-nos. Não sabemos respeitar-nos. Não nos controlamos. Não nos compreendemos. Não nos coibimos seja do que for. Nem sequer conseguimos inventar uma cura para a constipação ou uma desculpa melhor do que “Está em reunião”. Ainda somos animais. Não gosto de animais. Os animais são maus. São pouco sofisticados. São pão-pão queijo-queijo sem o pão e sem o queijo. Não escrevem. Não se riem. Não fazem amor como deve de ser. Não têm imaginação. Não se deixam prender por uma ideia abstracta. O pior dos animais, aliás, é serem destituídos de abstracção. Os animais são seres humanos com limitações ainda maiores.
Quando vejo um documentário sobre aranhas ou lavagantes e reparo na maneira como se tratam, dou graças a Deus de ser humano. Posso ser desprezível, mas era incapaz de comer a cabeça da minha namorada (por muito que já me tivesse apetecido) ou as pernas da minha mãe. Preferia ser judeu à porta da câmara de gás e ter um nazi pela frente, do que ser mosca presa na teia de uma aranha. Com um nazi sempre se pode conversar. Sempre se pode cuspir-lhe na cara e chamar-lhe nomes. O que alivia. Um aranhiço está se completamente nas tintas.
Estamos no princípio dos princípios. O mal dos homens é serem demasiado parecidos com os outros mamíferos. São macacudos e bovinos. Só ligeiramente melhores. Cospem na rua. Apalpam nos autocarros. Comem como uns javardos. Andam à porrada. Gemem, urram, fornicam e fazem jogging.
O principal sinal de humanidade é a maneira como só seres humanos tratam os animais. O ser realmente sensível e pensante, carinhoso por sentimento e prestável por sistema, teria a delicadeza da superioridade. Há-de reparar-se que as pessoas e as civilizações mais brutas são as que mais maltratam os animais. É preciso um mínimo de humanidade para se ter pena dos bichos. Os bichos não são gente, mas não tem culpa de não ser. Nós temos. Tenho um gato que adoro, mas não aguento vê-lo a torturar os passarinhos que apanha na varanda. Não havia em Auschwitz crueldade como a deste Agostinho. Ninguém o poderia defender em Nuremberga. Ele não tem culpa, mas o facto de não ter culpa não o pode absolver. É mau. É querido. Mas só pensa em comer e dormir. Nunca vi o materialismo levado a tal extremo.
Temos de ser mais humanos. Reconhecer que somos as bestas que somos e arrependermo-nos disso. Temos de nos reduzir à nossa miserável insensibilidade, à pobreza dos nossos meios de entendimento e explicação, à brutalidade imperdoável dos nossos actos. O nosso pé foge-nos para o chinelo porque ainda não se acostumou a prender-se aos troncos das árvores, quanto mais habituar-se a usar sapato. “
Estamos mal. A procissão ainda vai no adro. A Idade da Pedra não só começou mal, como mal começou. Estamos a matar-nos todos uns aos outros. Não percebemos nada. Andamos de um lado e de um dia para o outro sem saber porquê.
Somos ainda selvagens. Somo macacos. Rio-me de quem acrescenta nus ou inteligentes. Somos praticamente tão peludos e estúpidos como os chimpanzés. O que nos distingue, tal como os chimpanzés, é a mania de que somos bons.
Estamos atrasados. O nosso atraso não é tecnológico. É civilizacional. Não sabemos comer a mesa. Não sabemos vestir-nos. Não sabemos respeitar-nos. Não nos controlamos. Não nos compreendemos. Não nos coibimos seja do que for. Nem sequer conseguimos inventar uma cura para a constipação ou uma desculpa melhor do que “Está em reunião”. Ainda somos animais. Não gosto de animais. Os animais são maus. São pouco sofisticados. São pão-pão queijo-queijo sem o pão e sem o queijo. Não escrevem. Não se riem. Não fazem amor como deve de ser. Não têm imaginação. Não se deixam prender por uma ideia abstracta. O pior dos animais, aliás, é serem destituídos de abstracção. Os animais são seres humanos com limitações ainda maiores.
Quando vejo um documentário sobre aranhas ou lavagantes e reparo na maneira como se tratam, dou graças a Deus de ser humano. Posso ser desprezível, mas era incapaz de comer a cabeça da minha namorada (por muito que já me tivesse apetecido) ou as pernas da minha mãe. Preferia ser judeu à porta da câmara de gás e ter um nazi pela frente, do que ser mosca presa na teia de uma aranha. Com um nazi sempre se pode conversar. Sempre se pode cuspir-lhe na cara e chamar-lhe nomes. O que alivia. Um aranhiço está se completamente nas tintas.
Estamos no princípio dos princípios. O mal dos homens é serem demasiado parecidos com os outros mamíferos. São macacudos e bovinos. Só ligeiramente melhores. Cospem na rua. Apalpam nos autocarros. Comem como uns javardos. Andam à porrada. Gemem, urram, fornicam e fazem jogging.
O principal sinal de humanidade é a maneira como só seres humanos tratam os animais. O ser realmente sensível e pensante, carinhoso por sentimento e prestável por sistema, teria a delicadeza da superioridade. Há-de reparar-se que as pessoas e as civilizações mais brutas são as que mais maltratam os animais. É preciso um mínimo de humanidade para se ter pena dos bichos. Os bichos não são gente, mas não tem culpa de não ser. Nós temos. Tenho um gato que adoro, mas não aguento vê-lo a torturar os passarinhos que apanha na varanda. Não havia em Auschwitz crueldade como a deste Agostinho. Ninguém o poderia defender em Nuremberga. Ele não tem culpa, mas o facto de não ter culpa não o pode absolver. É mau. É querido. Mas só pensa em comer e dormir. Nunca vi o materialismo levado a tal extremo.
Temos de ser mais humanos. Reconhecer que somos as bestas que somos e arrependermo-nos disso. Temos de nos reduzir à nossa miserável insensibilidade, à pobreza dos nossos meios de entendimento e explicação, à brutalidade imperdoável dos nossos actos. O nosso pé foge-nos para o chinelo porque ainda não se acostumou a prender-se aos troncos das árvores, quanto mais habituar-se a usar sapato. “
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