Que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar?
“-Gosto de ti
A borboleta trémula de um pedido
- Não contes a ninguém”
“(…) nunca vi uma pessoa ocupar tão pouco espaço como ele nessa tarde à medida que fragmentos indecisos principiavam a unir-se em mim, membranas transparentes e essa espécie de lágrimas que nos acompanham toda a vida, algumas vezes nas pálpebras mas a maior parte do tempo ocultas de nos, numa das pregas de desconsolo de que somos feitos, se conseguisse contar-vos, e não consigo, o que nos rói sem sabermos, o que custa sem darmos fé omitindo os segredos estrangulados e as misérias conscientes, tanta boneca falecida, tantos olhos só nossos que nos censuram.”
“com pena do meu marido e de nos, vi-o entrar no carro, vi-o a ver-me demorando a entrar, esperei um gesto e gesto algum, um braço que acenasse, a bandeirola de um sorriso a desistir(…)”
“com o acaso da mão sempre me admirei que os olhos se tornem cegos quando não os usamos, se encontrasse um gato num canteiro fugia de mim como tudo me foge…”
“quase tudo se passa em silencio na vida, mesmo os gritos”
“a condição humana é um abismo”
“- Estou tão gasta”
“- Onde estou que não sei?”
“Tantas coisas outrora dando nexo aos dias, a mãe a estender roupa nas traseiras serenava-o, que certeza de eternidade e que ausência de ameças”
“é isso que me assusta na morte, a hipótese do não fim do que vivemos, tudo idêntico de maneira diversa, a intensidade das emoções, as lágrimas e o riso intactos…”
“pessoas que ao cumprimentarem me devolvem o nome”
“que tenebrosa a velhice, já viram coisa pior, ainda ontem trinta anos e de repente sessenta e sete e decrépita, estas cordas no pescoço, estas sardas nas mãos, desistir a meio do corredor se vou da sala à cozinha porque o coração, as pernas….”
“- Em que tempo estou eu?”
“como se consegue viver privado de recordações de uma época feliz?”
“Estou a ganhar coragem para pegar no ferro”
“Há milagres, pessoas que voltam depois de amanha, para a semana, um dia e resta a esperança que ajuda e uma vozinha no interior de nos a cantar, um pouco trémula é certo e todavia a cantar, se ao menos um retrato, um postal, uma ponta de laço, seja o que for que você guardasse, visitasse em segredo, envelhecesse consigo”
“acabou-se, há ocasiões em que nem tempo fica para uma despedida nos que gostamos tanto de emoções a principiar…”
“ resta a esperança que consola ou inventamos uma esperança para nos consolarmos”
“o meu tempo acabou”
“”-Como devo comportar-me?”
“se tivesse tempo não chorava”
“-Há quantos anos cá estamos?”
“o que me apetece é um sitio longe onde não saibam quem sou”
“não é tanto a morte, é o silencio antes dela”
“Nunca fui ao parque durante o dia e receio dar comigo entre as arvores e a minha cara de censura”
“-Não estas a exagerar?”
“-Há assuntos que se deixam em paz”
“à espera de não sei que, um gesto meu se calhar e eu a fingir que não via”
“se não fossem os relógios não envelhecíamos nunca, pelo menos os calendários, ao não tirarmos a folhinha, um Outubro constante, no relogio do colete o ponteiro dos segundos nervoso…..”
“não consigo contar as coisas por ordem, dado que as misturo em mim, ao atravessarem certas zonas da minha cabeça perco-as e ao recuperá-las altero-as, devo ter envelhecido…”
“- Fico aqui a eternidade inteira?”
“- já faleci, não ínsita”
“quem começa a importar-se com as pessoas já não se salva delas e a seguir o sofrimento da ausência, o ciúme, as trapalhadas que impedem o raciocínio e envenenam os dias…”
“-Tem-te sorrido a lua?”
“-Quem não tem fome de sopa, não tem fome de doce”
“sou um sujeito realizado”
“Quase não me apercebo do silencio por existir tanto ruído em mim, passos mas para onde e de que me, e vozes chamando que pessoa e sobretudo o mecanismo da minha vida que não pára de andar e eu tão fraca, não entendo o que me acontece, e o que sou….”
“Pensando como as verdades mentem”
“nunca houve um rapaz à minha espera”
“é uma luta constante para tudo”
“importa-me a felicidade que sinto por se ocuparem de mim, não peço muito pois não, que se ocupem de mim um bocadinho…”
“procurando adivinhar o que eu sentia e não sentia fosse o que fosse ou sentia coisas sem importância para os outros e que me custam contar”
“não entendia a hostilidade do mundo”
“-o que te falta?
Não sabia responder, uma fracção da cabeça, a que permite exprimir-me, o coração, ausente que não escuto, uma artéria no seu lugar contraindo se de tempos a tempos…”
“que curiosa a memoria, julga-se que a perdemos e ei-la de volta, tanta gente que persiste na minha cabeça a falar…”
“ - Achas que me curo?"
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