Friday, September 11, 2009

António Lobo Antunes....Grande...muito grande


"Tenho ideia que anda uma dor por aí, mas não estou certa de me pertencer"

"A dor que não estou certo de pertencer abranda, e depois volta,digo-lhe
-Olá dor...
e não lhe dou confiança. Não se deve dar confiança nem a nós,há que nos pôr em ordem. Põe-te em ordem António,tu que durante a vida inteira detestaste obedecer. Aliás não te podes queixar, passaste o tempo a fazer o que querias. Agora, sei lá porquê, veio-me à ideia o meu irmão Pedro, o silêncio dele. Gosto de silêncio, de escutar palavras não ditas. Também gosto de pessoas que falam porque me permitem ir embora continuando ali. Elas falam, digo que sim com a cabeça e não estou. Estou onde? Na varanda da Beira a olhar a serra, por exemplo. Ou em parte nenhuma, num esconso interior, sentado no chão, de joelhos na boca, escutando o que não há. Desde que me lembro escuto o que não há, deixo que as coisas se inventem cá dentro, a minha cabeça é uma praia que a água invade e esquece."

"-Sente dores,maezinha?
e no caso de se interessarem por mim o que responderia? Talvez, lá no fundo, mas disfarço, garanto. É que existem coisas que não sararam na alma, não hão-de sarar nunca: as árvores de um cemitério de província a tremerem, algumas mortes, a minha violência tantas vezes injusta, patetices, indelicadezas, faltas de atenção com quem o não merecia. Espero ter melhorado, acho que melhorei mas continuo sem me perdoar o egoísmo necessário à escrita que me obrigou a cortar tantos pescoços que se interpunham entre eu e ela. No entanto, aprecio o António: comove-me a sua feroz guerra civil interior, a vulnerabilidade escondida, a compaixão que não mostra. O imenso orgulho que tem nos seus poucos amigos, a admiração por eles, o respeito."

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